A penhora é ato de execução envolvendo pagamento de quantia, em dinheiro, do patrimônio do devedor, que não pagou o débito espontaneamente. Logo, o ato da penhora de valores é extremamente importante para a satisfação do crédito do Credor, não importando a origem da dívida, ainda mais considerando muitas vezes dispendioso e longo processo de conhecimento até que a ele se chegue.
Quando não satisfeito o crédito voluntariamente pelo devedor, o maior desejo do advogado, que reflete também a vontade do cliente, é ter sucesso na busca de ativos com a penhora on-line. Razão disso é que, com o levantamento em dinheiro, se evita a abertura de mais uma dispendiosa fase da execução, como a expropriação de algum bem, com ida do mesmo a leilão, ou, através da adjudicação, opte por ficar com o bem não monetário. Com efeito, óbvio é que, não satisfeito voluntariamente o débito pelo devedor, a penhora on-line passa a ser o próximo passo, mais desejável pra enfim haver o pagamento, mesmo que forçado.
Ocorre que a novíssima lei de abuso de autoridade vem trazendo receio aos magistrados em opera-la integralmente, sob o argumento de risco de cometimento de crime de abuso de autoridade, previsto em seu artigo 36º.
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Não obstante, o indeferimento da penhora com mera justificativa de que se trata de abuso de autoridade, por óbvio, não pode vingar, sob pena de se esvaziar este importante instituto processual.
Os tribunais vem expondo esse posicionamento, sob o argumento de que o artigo 36º da Lei n.º 13.869/19 está em plena harmonia com o rito previsto no art. 854 do Código de Processo Civil[2], e a penhora em dinheiro, que é direito do credor- o mais desejável depois do pagamento voluntário, como dissemos- está no topo da lista de preferência estabelecida pelo artigo 854 do CPC.
Portanto, não há que se dizer que o art. 38 da lei de abuso de autoridade implica em esvaziamento do art. 854, porquanto, aquele apenas estabelece como crime ato excessivo que não observe o que já vinha disposto no art. 854 do Código de Processo Civil.
Neste sentido, há uma recente decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (ipsis verbis):
“Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. FAMÍLIA. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE PENHORA COM FULCRO NA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE. DESCABIMENTO. É incabível o indeferimento de pedido de penhora on-line em razão do disposto no artigo 36 da Lei de Abuso de Autoridade, porquanto não se configura o delito previsto no referido dispositivo legal com a mera decretação de indisponibilidade de ativos financeiros do devedor. O artigo 36 da Lei nº 13.869/19 está em harmonia com o rito previsto no artigo 854 do Código de Processo Civil, e a penhora de dinheiro, que é direito do credor, está no topo da lista de preferências estabelecida no artigo 835 do Código de Processo Civil. Agravo provido.(Agravo de Instrumento, Nº 70083864926, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Afif Jorge Simões Neto, Julgado em: 19-02-2020)”.
Portanto é prioritária a penhora em dinheiro, nos termos do Código de Processo Civil, podendo a ordem ser alterada de acordo com o caso concreto; não se tratando de ordem absoluta, cabendo, portanto, exceções.
Questão que de fato acontece, é o excesso de penhora- mesmo que seja posteriormente feito o desbloqueio- quando o devedor possui mais de uma conta bancária e, uma instituição bancária não sabendo dos ativos existentes em outra, acaba por ocorrer o bloqueio em mais de uma instituição, o que pode levar ao entendimento de que houve um excesso no bloqueio dos valores, violando assim o art. 36 da Lei de Abuso de Autoridade.
Conclusão:
Não pretendemos aqui fazer qualquer juízo de valor, ou ousar dizer como a penhora on-line deva acontecer; deixemos isso para os magistrados e tribunais. Apenas levantamos a questão de que a penhora on-line é direito do credor, tem preferência sobre outros meios de satisfação do crédito. Não há que se relativizar este importante instituto processual e criar ainda mais entraves e benefícios ao devedor, sob o argumento de que a lei de abuso de autoridade veio para limitar sua aplicação. Sua integral operacionalização é perfeitamente viável. Deve, obviamente, agora ser feita com mais cautela, mas está em plena sintonia com ordenamento jurídico, não havendo qualquer impedimento trazido pela Lei de Abuso de Autoridade. O receio dos magistrados é natural e compreensível, mas o direito à penhora on-line ainda vige plenamente no ordenamento jurídico, e sua mitigação não deve ser aceita.
[1] Art. 36. Decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte e, ante a demonstração, pela parte, da excessividade da medida, deixar de corrigi-la: Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Lei n.º 13.869/19.
[2] Art. 854: Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, sem dar ciência prévia do ato ao executado, determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional, que torne indisponíveis ativos financeiros existentes em nome do executado, limitando-se a indisponibilidade ao valor indicado na execução.
§ 1º No prazo de 24 (vinte e quatro) horas a contar da resposta, de ofício, o juiz determinará o cancelamento de eventual indisponibilidade excessiva, o que deverá ser cumprido pela instituição financeira em igual prazo.
§ 2º Tornados indisponíveis os ativos financeiros do executado, este será intimado na pessoa de seu advogado ou, não o tendo, pessoalmente.
§ 3º Incumbe ao executado, no prazo de 5 (cinco) dias, comprovar que:
I - as quantias tornadas indisponíveis são impenhoráveis;
II - ainda remanesce indisponibilidade excessiva de ativos financeiros.
§ 4º Acolhida qualquer das arguições dos incisos I e II do § 3º, o juiz determinará o cancelamento de eventual indisponibilidade irregular ou excessiva, a ser cumprido pela instituição financeira em 24 (vinte e quatro) horas.
§ 5º Rejeitada ou não apresentada a manifestação do executado, converter-se-á a indisponibilidade em penhora, sem necessidade de lavratura de termo, devendo o juiz da execução determinar à instituição financeira depositária que, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, transfira o montante indisponível para conta vinculada ao juízo da execução.
§ 6º Realizado o pagamento da dívida por outro meio, o juiz determinará, imediatamente, por sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional, a notificação da instituição financeira para que, em até 24 (vinte e quatro) horas, cancele a indisponibilidade.
§ 7º As transmissões das ordens de indisponibilidade, de seu cancelamento e de determinação de penhora previstas neste artigo far-se-ão por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional.
§ 8º A instituição financeira será responsável pelos prejuízos causados ao executado em decorrência da indisponibilidade de ativos financeiros em valor superior ao indicado na execução ou pelo juiz, bem como na hipótese de não cancelamento da indisponibilidade no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, quando assim determinar o juiz.
§ 9º Quando se tratar de execução contra partido político, o juiz, a requerimento do exequente, determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido por autoridade supervisora do sistema bancário, que tornem indisponíveis ativos financeiros somente em nome do órgão partidário que tenha contraído a dívida executada ou que tenha dado causa à violação de direito ou ao dano, ao qual cabe exclusivamente a responsabilidade pelos atos praticados, na forma da lei. Art. 854 do Código de Processo Civil.
Autor: Wagner Frozi
Fontes: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13869.htm
e http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm
OAB/RS n.º 71.705
Data: 03 de março de 2020.